Somos canibais modernos. Nascemos e crescemos para o sucesso, e muitas vezes, em nossa competição desenfreada, acabamos “engolindo” quem ousa atravessar o nosso caminho.
Competir. Vencer. Ganhar.
Nos acostumamos tanto com estes verbos que, naturalmente, começamos a colocá-los à frente de outros verbos, como ajudar, apoiar, entender, compreender.
Tudo começa cedo. Infelizmente cada vez mais cedo.
Crianças de 3, 4 anos bilíngues, com agenda lotada. É comum ouvirmos: “Meu filho tem que ser o melhor.” Me questiono: No que? E pra que?
Ah, já sei, pra vida! A vida é dura, é preciso estar preparado, ser o melhor, ter diferenciais. Foi isso que nos disseram, nos ensinaram, desde sempre.
E então chegamos nos 7, 8 anos. Tirar 10 na prova, ser o melhor da classe, ganhar a competição de matemática, a olimpíada escolar de ciências. Para dali a 2 ou 3 anos já estar se preparando para a faculdade.
Faculdade! O ápice da competição juvenil começa na entrada: 100 vagas para 1000 candidatos. Para ter sucesso é preciso estudar na universidade X, ter o diploma Y e trabalhar em empresas Z. E entrar na empresa Z não é pra qualquer um, será uma nova competição, um novo “vestibular”, afinal são poucas as “boas” vagas.
Competimos o tempo todo.
Quem andou ou falou a primeira palavra mais cedo.
Quem entrou primeiro na escola, ou aprendeu a ler, ou tirou sua primeira nota 10.
Quem beijou primeiro, arrumou a primeira namorada, arrumou o primeiro emprego, teve a primeira promoção.
No trânsito caótico, a competição de quem acelera e chega primeiro. Competimos pela vaga no estacionamento, pela mesa na praça de alimentação do shopping. Competimos pelas melhores promoções nas lojas, competimos para sermos e parecermos melhores do que os outros, sempre.
Parece que a vida é isso: uma eterna competição para sabermos quem vai se dar bem primeiro, quem vai ganhar o que – ou pior: de quem!
E precisamos mesmo disso tudo? Sucesso é isso? E o caminho da competição é o único a ser seguido?
Todo este texto, estas dúvidas que espero ter colocado em sua cabeça, servem apenas para uma coisa: refletirmos sobre o quanto fomos criados para competir – e o quanto repetimos e incentivamos este modelo à cada nova geração.
Vencer não está errado, está certíssimo.
O que para mim está errado é o modelo onde, para ganhar, eu preciso derrotar ou passar por cima de alguém. Preciso eliminar alguém. Repito: precisamos mesmo?
Preciso ser melhor sim. Melhor do que eu mesmo, e não melhor do que o outro. A competição é interna.
Está lá, em algum lugar da Bíblia: “Amai-vos uns aos outros.” E até onde eu sei, ainda não saiu a versão revisada, escrita: exceto em casos de vestibular, busca de emprego ou promoção. Amai-vos sempre. A cada dia. Independente da situação financeira, da cor da pele, da posição que a pessoa ocupa, da vantagem que ela possa te oferecer.
E aqui entram dois termos que também tenho questionado muito: Vantagem e Oportunidade.
Se algo foi vantajoso, é necessário refletir: e para alguém, isso foi uma perda? Se a vantagem significa, mesmo que implicitamente, que alguém foi prejudicado, simplesmente não foi vantagem.
E o mesmo serve para oportunidade, principalmente no mundo dos negócios e parcerias. Se algo é uma oportunidade para mim, significa que estou levando vantagem sobre outro? Se sim, analise. Parceria e oportunidade real, é benéfico para todos que participam.
Quando apenas um lado se beneficia isso não é oportunidade, é ganho unilateral. Alguém saiu perdendo para você sair ganhando.
Toda essa nossa ânsia por competir e ganhar tem nos tornado adultos infelizes e ansiosos. Não vamos ganhar sempre. Na vida real, diferente do que acontece nos jogos de tabuleiro ou eletrônicos, não dá pra guardar na caixa ou reiniciar quando a situação está ficando nebulosa. É preciso insistir, muitas vezes quebrar a cara, para então crescer, evoluir e ter sucesso.
Se nós estamos cada vez mais ansiosos e frustrados, o que dizer dos jovens? Estamos criando jovens despreparados para as derrotas e quedas, tão comuns na vida real. O mercado de trabalho está lotado de mini gênios phd’s que dão chilique quando contrariados ou quando algo dá errado.
Entupimos a agenda das crianças com obrigações e atividades, buscando as preparar para a vida adulta bem-sucedida, e quando esta fase chega, eles já aprenderam a lição: não aprenderam a relaxar, a descontrair, brincar e aproveitar o ócio. Estão estressados, sufocados, sendo cobrados pela máxima performance e resultados a qualquer custo. A meta é ser melhor e mais eficiente a cada dia.
Não sabemos relaxar e nem lidar com o que dá errado. E se temos uma certeza na vida, é a de que costumeiramente, muita coisa dará errado.
Precisamos justificar cada momento de descanso com algo construtivo, que nos ensine algo, que colabore com a nossa trajetória profissional, que nos enriqueça culturalmente para termos o que falar num próximo encontro – e assim, ganhar “moral” com os presentes e mostrar que entendemos mais do que os outros sobre tal tema – novamente, ganhar.
E de onde nasceu grande parte dessa nossa competitividade? Do paradigma da escassez.
A escassez se inicia quando acreditamos que algo vai faltar. Não terá comida, não terá dinheiro, não terá emprego, não terá onde morar. E não ter algo tão importante, traz o medo. E quando tenho medo, me defendo.
Acreditamos que a melhor defesa, é o ataque. Preciso competir e ganhar.
Mas a melhor defesa é acreditar e viver no paradigma da abundância. Onde tudo é farto, abundante e suficiente para todos. Que se todos se empenharem, fizerem sua parte e não guardarem mais do que precisam ter, sempre haverá o suficiente para todos.
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Quando passamos a acreditar e agir movidos pelo paradigma da abundância, o fluxo de reais oportunidades acontece em nossa vida.
O fluxo da abundância é como a água de um rio: a água continua seu caminho, mesmo que pedras caiam em seu leito. Mas se um fazendeiro por onde o rio passe resolve represá-lo, faltará água no próximo sítio. Mas não deveria. Em seu estado natural, a água seria suficiente para todos. Alguém ficou com mais do que precisava.
Mas não basta apenas acreditar que algo bom vai acontecer, é preciso agir.
E como podemos mudar esse pensamento, guardar a competição para os momentos realmente necessários?
Estarmos conscientes de que estamos competindo.
Analisarmos nossas ações, sabermos a real intenção de cada ato. Como disse acima, vencer é bom, mas precisamos estar cientes do preço de cada vitória, e se realmente o troféu final valeu a pena.
É como o general que chega ao final da batalha, ganha a guerra mas olha em volta e vê que nenhum soldado permaneceu vivo. Valeu a pena ganhar?
Muitas vezes, em nossas batalhas diárias, perdemos amigos, família, saúde e até mesmo nossos valores. Tenha consciência de suas batalhas.
Saber quais bandeiras devemos levantar
Muitas vezes entramos em batalhas que não são nossas. Defendemos a bandeira de um amigo, de um parente e até mesmo de uma empresa. Lutamos por uma causa que às vezes nem sabemos direito qual é. E quando tomamos consciência, percebemos que a luta não é nossa.
Consciência, mais uma vez – e como sempre – ela aparece.
Abandone a guerra. Peça desculpas a quem tiver machucado, tente ajudar. Sempre é tempo de mudar lado, de opinião.
Triste não é mudar de ideia. Triste é não ter ideias para mudar.
Ter clareza sobre o que te motiva a competir
Existe um real motivo para a competição ou existe outro caminho? Em muitos casos, a competição acaba ocorrendo por hábito ou por ego, e não pela batalha ou prêmio em si. É um simples vencer para provar aos outros quem é o melhor.
Uma frase que gosto muito e que pode te inspirar:
“Na terra do “eu sei”, há sempre competitividade, ciúme, pretensão, orgulho e arrogância. É um reino agressivo – o reino do ego. Eu digo, recuse a cidadania. Na terra do “eu não sei”, os habitantes movem-se sem conflito e são naturalmente serenos, felizes e em paz. O sábio permanece aqui.” Mooji
Estabelecer reais parcerias – o verdadeiro ganha-ganha
Pense sempre no real motivo de estar fazendo um negócio, propondo uma parceria. Se o ganho é só seu, deixe isso claro, peça ajuda, e se os demais envolvidos aceitarem, sem problemas. O ganho unilateral será consciente. Assim não há desequilíbrio, o fluxo continuará a agir.
Amar a todas as pessoas e seres vivos
Quando eu realmente amo outro ser, não quero que nada de ruim aconteça para ele. Simples assim. Como eu serei o agente de sofrimento ou privação dele? Realmente, o amor é sempre a melhor escolha.
A vida não é sobre quem ganha. É sobre quem vive.
Você já escalou uma montanha, fez uma trilha, se desafiou num caminho íngreme na natureza? Eu já. Se você não fez, posso te contar sobre a minha vivência.
Na trilha, na montanha, não há competição, não existe o “chegar”. Existe o caminhar, o evoluir. A graça está no caminho e na superação, não no ponto final.
Por isso comparo a trilha com a vida. As duas únicas certezas que temos é que nascemos e que um dia morreremos. O início e o fim da caminhada. A aventura está no que você fará pelo caminho.
Você vai destruir a mata, derrubar as pedras, poluir os rios e matar os passarinhos ou vai seguir observando o esplendor da natureza à sua volta, aproveitar a paisagem, se refrescar no riacho, se deslumbrar com a vista no meio da montanha?
A vida é isso, um vai e vem de belezas, felicidades e emoções.
Mas quando nos preocupamos demais em competir, ganhar e acumular, perdemos o que há de mais lindo: nossa capacidade de nos emocionar com as coisas mais bonitas e singelas.
Viva Feliz.